POÉTICAS EXPERIMENTAIS
Faz este mês 26 anos que conheci os poetas históricos do movimento da poesia experimental.
Em 1983 o António Barros, o Silvestre Pestana e eu, apresentámos intervenções poéticas na Alternativa 3 – III Festival Internacional de Arte Viva, organizado pelo Egídio Álvaro, o que na altura resultava em algo de novo do ponto de vista poético: intervenções realizadas por poetas que não eram declamações nem leituras, mas a apropriação da linguagem da performance para apresentar uma poética onde o corpo também tinha algo a “dizer”.
Desse encontro, e depois de uma conversa sobre o que (não) estava a acontecer com a poesia experimental, eu e o Silvestre Pestana achámos que se devia fazer o ponto da situação editando um caderno onde cada poeta experimental apresentasse os pressupostos teóricos daquilo que andava a fazer e, ao mesmo tempo, que perspectivasse o que iria fazer no futuro, ou que caminhos é que achava que iria tomar a poética de cariz mais experimentalista, considerando que pensávamos serem urgentes soluções mais criativas e a utilização de outros suportes para que a poesia pudesse evoluir e expressar-se através de linguagens mais contemporâneas.
Por uma questão prática (O Silvestre vivia no Porto, enquanto eu e a maior parte dos poetas morávamos em Lisboa), fiquei encarregue de contactar e de apresentar pessoalmente a cada poeta esse nosso projecto. O que para mim foi uma tarefa que me encheu – posso dizê-lo sem preconceitos – de uma alegria enorme. Conhecer finalmente os poetas que eu mais lia, que tinha pesquisado enquanto estudante de Belas-Artes, e que eram dos escritores que mais admirava!
Devo acrescentar que naquela data já tinha feito 3 exposições individuais de poesia visual (desde a minha primeira exposição, em 1979 sempre utilizei este termo, enquanto praticamente todos os outros poetas se auto-denominavam poetas experimentais), mas nunca tínhamos cruzado caminhos. Recordo perfeitamente que na mesma altura em que esses poetas participavam na importantíssima PO.EX, na Galeria Nacional de Arte Moderna de Lisboa, em Belém (1980), eu tinha a minha segunda exposição no Teatro Aberto, também em Lisboa.
E durante o mês de Setembro de 1983 cumpri a “espinhosa” missão de apresentar o projecto que mais tarde viria a resultar num livro. Em minha casa ou em casa dos próprios, fui conhecendo sucessivamente E. M. de Melo e Castro, Ana Hatherly, Salette Tavares, Alberto Pimenta, José-Alberto Marques e o António Aragão, que talvez tivesse conhecido mais tarde, considerando que vivia na Madeira, e já não me recordo se esteve em Lisboa nessa altura.
Graças ao entusiasmo com que todos reagiram à proposta e à dinâmica que então se criou, o pequeno caderno que tínhamos previsto organizar, rapidamente se transformou em algo mais volumoso, com 270 páginas, que depois de algumas peripécias acabou por se intitular “POEMOGRAFIAS – Perspectivas de Poesia Visual Portuguesa”, editado pela Ulmeiro, depois de um intenso trabalho de paginação. (a partir da edição desse livro, em Janeiro de 1985, generalizou-se a designação “poesia visual”, que passou a ser posteriormente utilizada por todos os poetas experimentais e não só).
Desenhei a capa do livro com base num poema de computador do Silvestre Pestana (que tinha criado os primeiros computer-poems em 1981/83 num “Spectrum”). E se agora parece uma coisa quase banal, em 1985 foi realmente “diferente” apresentar uma antologia de poesia e de teoria poética com uma obra “gerada” por computador na capa. (Como não tínhamos acesso a impressora – nem sei se havia naquela altura alguma associada ao Spectrum – fomos a uma loja de electrodomésticos e pedimos para ligar o “computador” a uma televisão, e ali mesmo fiz várias fotografias de um dos poemas, das quais resultou a capa de “POEMOGRAFIAS”.
O livro, que para além dos textos teóricos e das biografias dos autores incluiu inúmeros poemas visuais e fotografias de instalações poéticas, performances, videopoemas, fotopoesia, electrografias, poemas experimentais e projectos de poemas a concretizar no futuro (o meu poema “Imponder(h)abilidade – Projecto para simulador de anti-gravidade ou performance a realizar na lua”, de 1983 ainda não se realizou…), teve a colaboração de Abílio-José Santos, Alberto Pimenta, Ana Hatherly, Antero de Alda, António Aragão, António Barros, E. M. de Melo e Castro, Fernando Aguiar, José-Alberto Marques, Salette Tavares, Silvestre Pestana, e ainda a participação do crítico Egídio Álvaro e do músico Jorge Lima Barreto, porque já nessa altura considerávamos que as artes não deviam ser estanques e que a poesia podia ser potencializada através da interacção com outras artes…
Fernando Aguiar, "Imponder(h)abilidade", 1983